Convergencia Educativa, (18), julio-diciembre, 2025. ISSN: 0719-3351  
 

Resenha crítica capítulo 6: Interação entre aprendizado e desenvolvimento Obra: A Formação Social da Mente Lev S. Vygotsky

Critical Review of Chapter 6: Interaction Between Learning and Development Work: The Social Formation of the Mind – Lev S. Vygotsky

Reseña crítica del capítulo 6: Interacción entre aprendizaje y desarrollo Obra: La formación social de la mente – Lev S. Vygotsky

Castillo Cabezas, M.1


Castillo Cabezas, M. (2025). Resenha crítica capítulo 6: Interação entre aprendizado e desenvolvimento. Revista Convergencia Educativa, (18), 69-79. https://doi.org/10.29035/rce.18.69

[Recibido: 07octubre, 2025 / Aceptado: 10 noviembre, 2025]

RESUMO

O objetivo desta resenha é analisar criticamente o Capítulo 6 de "A Formação Social da Mente" de Vygotsky, examinando a sua tese central sobre a relação dialética entre aprendizado e desenvolvimento. Com um enfoque analítico que articula a teoria vygotskyana com perspectivas contemporâneas, o texto expande o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP). A ZDP é apresentada como a solução de Vygotsky às visões que separam ou identificam os dois processos, definindo-a como o espaço entre o nível real e o potencial de desenvolvimento, ativado pela mediação social. A análise conclui, por meio do diálogo com a cognição situada e a inteligência distribuída, que a aprendizagem é um motor social, cultural e mediado, fundamental para despertar o potencial cognitivo interno.

Palavras-chave: Vygotsky; Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP); Mediação Social; Cognição Situada; Aprendizagem.




ABSTRACT

The aim of this review is to critically analyze Chapter 6 of The Social Formation of the Mind by Vygotsky, examining its central thesis on the dialectical relationship between learning and development. With an analytical approach that connects Vygotskian theory to contemporary perspectives, the text expands the concept of the Zone of Proximal Development (ZPD). The ZPD is presented as Vygotsky’s solution to views that either separate or equate these two processes, defining it as the space between the actual and potential levels of development, activated through social mediation. The analysis concludes, through dialogue with situated cognition and distributed intelligence theories, that learning is a social, cultural, and mediated engine, fundamental for awakening internal cognitive potential.

Key words: Vygotsky; Zone of Proximal Development (ZPD); Social Mediation; Situated Cognition; Learning.

RESUMO

El objetivo de esta reseña es analizar críticamente el capítulo 6 de La formación social de la mente de Vygotsky, examinando su tesis central sobre la relación dialéctica entre aprendizaje y desarrollo. Con un enfoque analítico que articula la teoría vygotskiana con perspectivas contemporáneas, el texto amplía el concepto de Zona de Desarrollo Próximo (ZDP). La ZDP se presenta como la solución propuesta por Vygotsky frente a las visiones que separan o identifican ambos procesos, definiéndola como el espacio entre el nivel real y el nivel potencial de desarrollo, activado por la mediación social. El análisis concluye, a través del diálogo con las teorías de la cognición situada y la inteligencia distribuida, que el aprendizaje es un motor social, cultural y mediado, fundamental para despertar el potencial cognitivo interno.

Palabras clave: Vygotsky; Zona de Desarrollo Próximo (ZDP); Mediación social; Cognición situada; Aprendizaje.


O Capítulo 6 da obra de Vygotsky representa uma inflexão paradigmática no campo da psicologia educacional ao abordar um dos problemas epistemológicos centrais do campo: a relação entre desenvolvimento e aprendizado. É fundamental notar que a obra de referência, A Formação Social da Mente, não é um trabalho singular, mas uma coletânea de ensaios organizada por Michael Cole e colaboradores para tornar o pensamento vygotskyano mais acessível. A análise a seguir baseia-se na sua 4ª edição brasileira (Martins Fontes, 1991), traduzida por José Cipolla Neto et al. Conforme afirmado no próprio capítulo, este problema é o mais obscuro de todos os problemas básicos para a aplicação de teorias do desenvolvimento infantil aos processos educacionais (Vygotsky, 1991, p. 101). Tal obscuridade, argumenta o autor, não decorre de mera limitação empírica, mas sim de deficiências conceituais nos modelos que historicamente embasaram tanto a teoria como a prática pedagógica.

Vygotsky inicia sua análise com uma apresentação crítica de três posições teóricas dominantes. A primeira, representada por Piaget, defende a independência entre desenvolvimento e aprendizado, afirmando que o desenvolvimento precede e determina as possibilidades de aprender. A arquitetura teórica piagetiana pressupõe que processos cognitivos fundamentais como dedução, compreensão, evolução conceitual, interpretação causal e domínio de formas lógicas se desenvolvam de maneira autônoma, sem a influência da aprendizagem escolar. Essa posição implica uma concepção maturacionista, na qual o desenvolvimento é um pré-requisito para a aprendizagem. Tal visão converte a aprendizagem em uma mera superestrutura que se sobrepõe ao desenvolvimento sem, contudo, modificar seu curso essencial. Para Vygotsky, essa visão negligencia a capacidade do ensino de intervir no próprio curso do desenvolvimento, transformando o aprendizado numa sombra que segue o desenvolvimento.

A segunda posição, associada a correntes reflexológicas e ao pensamento de William James, concebe aprendizado e desenvolvimento como processos idênticos e simultâneos. Essa posição teórica reduz o desenvolvimento ao "domínio dos reflexos condicionados, estabelecendo que o processo de aprendizado está completa e inseparavelmente misturado com o processo de desenvolvimento". A formulação jamesiana define a educação como a organização dos hábitos de conduta e tendências comportamentais adquiridos, reduzindo o desenvolvimento a uma mera acumulação de respostas condicionadas. Essa perspectiva, embora aparentemente oposta à primeira, compartilha com ela uma concepção mecanicista, na qual o desenvolvimento é concebido como "elaboração e substituição de respostas inata.

A terceira posição, de orientação gestaltista e representada por Kurt Koffka, propõe uma síntese. Nela, a maturação prepara o aprendizado, que, por sua vez, estimula a própria maturação. A inovação koffkiana reside em propor uma relação de interação mútua, na qual "o processo de maturação prepara e torna possível um processo específico de aprendizado", enquanto "o processo de aprendizado estimula e empurra para a frente o processo de maturação". Essa formulação introduz a noção de que o aprendizado desempenha um papel ativo no desenvolvimento, embora mantenha a primazia ontológica da maturação. Ainda assim, Vygotsky aponta que essa perspectiva mantém a primazia da maturação e subestima o papel generativo do ensino.

Frente a essas limitações, Vygotsky formula o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) como categoria teórica central para compreender a dinâmica dialética entre aprendizado e desenvolvimento. A arquitetura teórica da ZDP articula-se sobre a distinção fundamental entre dois níveis de desenvolvimento: 1. Nível de desenvolvimento real, definido como o nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se estabeleceu como resultado de certos ciclos de desenvolvimento já completados. Este nível corresponde às capacidades que o sujeito pode exercer de maneira autônoma, sem assistência externa e 2. Nível de desenvolvimento potencial, determinado por meio da 'solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. Este nível revela as capacidades emergentes que requerem mediação social para sua atualização.

A ZDP representa o intervalo entre o que a criança já domina (nível de desenvolvimento real) e o que pode alcançar com apoio (nível de desenvolvimento potencial). Por isso, uma boa aprendizagem não significa ficar só no que ela já sabe, mas sim ajudá-la a avançar em direção ao que está ao seu alcance, com a orientação certa. Ao introduzir a ZDP, Vygotsky desloca o foco da psicologia educacional para a dimensão prospectiva do desenvolvimento. Ele argumenta que a zona de desenvolvimento proximal define aquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de maturação... essas funções poderiam ser chamadas de brotos ou flores do desenvolvimento, ao invés de frutos do desenvolvimento (Vygotsky 1991, p. 114). Essa metáfora organísmica sugere uma concepção do desenvolvimento como um processo contínuo, em que as funções psicológicas superiores surgem por meio da interação social antes de se internalizarem como capacidades individuais. A ZDP revela, assim, "o curso interno do desenvolvimento", oferecendo uma perspectiva prospectiva (de futuro) que vai além apenas do que já foi alcançado.

A originalidade da perspectiva vygotskyana reside em seu caráter prospectivo: enquanto as teorias tradicionais se limitavam a avaliar o desenvolvimento real, a ZDP direciona o olhar para o que está em processo de maturação aqueles brotos ou flores do desenvolvimento (Vygotsky 1991, p. 114) que só se revelam em situações de interação social. Tal premissa conduz a uma inversão fundamental do paradigma educativo, segundo a qual o bom aprendizado é aquele que se adianta ao desenvolvimento (Vygotsky,1991, p. 117). Em outras palavras, o ensino eficaz é aquele que não segue passivamente o desenvolvimento já consolidado, mas que antecipa, provoca e estimula transformações cognitivas ainda em gestação. Isso implica reconhecer que os processos de desenvolvimento não coincidem com os processos de aprendizado. Ou melhor, o processo de desenvolvimento progride de forma mais lenta e atrás do processo de aprendizado; desta sequenciação resultam, então, as zonas de desenvolvimento proximal (Vygotsky 1991, p. 117).

Ademais, Vygotsky reafirma a natureza intrinsecamente social e cultural do aprendizado humano. Ele argumenta que o aprendizado humano pressupõe uma natureza social específica e um processo pelo qual as crianças penetram na vida intelectual daquelas que as cercam (Vygotsky 1991, p. 120), o que o diferencia radicalmente de outras espécies, como demonstrado em seu estudo comparativo com primatas. Tal perspectiva encontra sua expressão máxima no processo de internalização, pelo qual o sujeito assimila e transforma as interações sociais em estruturas psicológicas internas. O aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em operação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte das aquisições do desenvolvimento independente da criança (Vygotsky 1991, p. 122).

No que tange à imitação, Vygotsky a considera um indicador de desenvolvimento potencial. A psicologia clássica havia estabelecido como princípio intocável que apenas a atividade independente da criança, e não sua atividade imitativa, indica seu nível de desenvolvimento. A perspectiva vygotskyiana inverte essa concepção, afirmando que uma pessoa só consegue imitar aquilo que está em seu nível de desenvolvimento possível. Essa reformulação implica que a imitação não é uma simples cópia mecânica, mas exige uma compreensão estrutural do objeto imitado. Assim, a capacidade de imitação revela o nível de desenvolvimento potencial do sujeito, e não seu nível de desenvolvimento real.

Nesta direção, Vygotsky propõe que o desenvolvimento humano é um processo social e mediado, no qual as funções psicológicas superiores (pensamento abstrato, linguagem, resolução de problemas) não surgem de forma isolada, mas sim por meio da interação com outros mais competentes (adultos, pares mais avançados). Essa mediação não é um mero "apoio externo", mas constitui a própria essência do desenvolvimento: sem ela, certas capacidades permaneceriam ocultas ou não seriam ativadas.

Um exemplo fundamental é a imitação: quando uma criança reproduz ações guiadas por um adulto, não está apenas copiando mecanicamente, mas internalizando estruturas cognitivas que depois dominará de forma autônoma. Como destaca Vygotsky, numa atividade coletiva ou sob a orientação de adultos, usando a imitação, as crianças são capazes de fazer muito mais coisas, ou seja, a colaboração revela seu potencial real, que não seria observável em situações de trabalho individual.

Esses pressupostos teóricos sobre o caráter social do desenvolvimento e a natureza mediada da aprendizagem - permitiram a Vygotsky não apenas criticar os modelos educativos de sua época, mas formular princípios pedagógicos revolucionários que redefiniram o papel do ensino. Suas implicações para a prática educativa, especialmente no que diz respeito à mediação docente e à organização de ambientes de aprendizagem colaborativos, mantêm notável atualidade nos debates pedagógicos do século XX, inspirando desde metodologias ativas até políticas públicas educacionais.

Este capítulo termina com uma crítica contundente à pedagogia tradicional, especialmente àquela pautada por avaliações psicométricas estáticas. Para o autor, essa perspectiva, ao buscar fixar o nível de desenvolvimento mental no qual o processo educacional deveria se basear, incorre em uma limitação grave: orientar o ensino exclusivamente aos estágios de desenvolvimento já consolidados. Tal postura, segundo Vygotsky, resulta em uma visão retrospectiva da aprendizagem, que paralisa o potencial criador da educação, condenando-a a repetir o passado em vez de construir futuros possíveis. Ignora-se, assim, o caráter dinâmico, social e historicamente mediado da aprendizagem humana.

Essa crítica torna-se ainda mais incisiva no contexto da educação especial. Ao analisar o ensino de crianças com deficiência intelectual, Vygotsky denuncia as contradições de uma prática pedagógica que, ao partir da suposição de que essas crianças não seriam capazes de pensamento abstrato, restringe-se a métodos puramente concretos. Com isso, longe de favorecer o desenvolvimento, a escola reforça as limitações cognitivas, produzindo o que o autor denomina "profunda desilusão". Contra essa lógica excludente, Vygotsky propõe uma inversão radical: exatamente porque essas crianças não atingiriam, sozinhas, formas mais elaboradas de abstração, cabe à escola impulsioná-las nesse sentido. A educação, portanto, deve ser concebida como instrumento de superação de limites, não de sua naturalização.

Vygotsky redefine não apenas o papel do ensino, mas a própria concepção de avaliação. Enquanto os métodos tradicionais se limitam a aferir aquilo que já foi atingido, a ZDP propõe que se investigue também o que está em processo de maturação. Essa mudança implica uma revolução metodológica: abandonar provas padronizadas em favor de interações mediadas que revelem potenciais ocultos, e compreender o desenvolvimento como uma paisagem em constante movimento, e não como uma fotografia fixa e estática.

Por fim, Vygotsky alerta para a especificidade do desenvolvimento nas distintas áreas do conhecimento. Cada disciplina estabelece uma relação específica com o curso do desenvolvimento, relação que se transforma com o tempo e com as condições socioculturais. Essa complexidade inviabiliza modelos pedagógicos universais e impõe a necessidade de pesquisas concretas, fundamentadas na ZDP, que orientem práticas didáticas flexíveis e sensíveis às particularidades de cada domínio disciplinar.


Vygotsky e a cognição situada: Um diálogo construtivo que expande a ZDP para além da mente individual.

A perspectiva da cognição situada, tal como apresentada por Brown et al., 1989 oferece uma lente enriquecedora para compreender e expandir o conceito de ZDP de Vygotsky. Os autores postulam que a aprendizagem não é meramente a aquisição de conhecimentos abstratos, mas sim “um processo de enculturação” (Brown et al., 1989, p. 7). Essa concepção alinha-se fundamentalmente com a visão vygotskyana, que sustenta que o desenvolvimento cognitivo é intrinsecamente social e cultural. A ZDP, nesse marco, emerge como o espaço onde o indivíduo, por meio da interação mediada por ferramentas culturais e em colaboração com outros mais competentes, transita de um nível de desenvolvimento real para um potencial, internalizando práticas e significados culturais.

Uma ideia central na cognição situada é a inseparabilidade entre conteúdo e contexto no processo de aprendizagem, onde “o conteúdo e o contexto estão inextricavelmente fundidos” (Brown et al., 1989, p. 7). Para Vygotsky, as funções psicológicas superiores têm origem nas relações sociais, e o contexto no qual a aprendizagem ocorre incluindo as situações sociais, as ferramentas disponíveis e as práticas culturais não é um mero pano de fundo, mas uma parte constitutiva daquilo que se aprende. A ZDP configura-se, então, como o âmbito preciso onde essa “fusão” ocorre, já que a compreensão e o desenvolvimento do aprendiz são moldados ativamente pelo contexto específico da atividade colaborativa.

O modelo de “Aprendizagem Cognitiva” (Cognitive Apprenticeship) proposto por Brown et al. (1989) é uma manifestação prática direta dos princípios da ZDP. Esse modelo inclui elementos como modelagem, coaching (treinamento) e scaffolding (andaime), que refletem de forma explícita a interação entre um aprendiz e um “outro mais capaz”. Por exemplo, a modelagem implica que o especialista realiza a tarefa, demonstrando o processo e tornando visível o que é “possível” para o aprendiz. O coaching refere-se à provisão de “pistas, ajuda, feedback, escolha de problemas sequenciados e encorajamento” enquanto o aprendiz tenta realizar a tarefa, guiando-o dentro de sua ZDP. Por fim, o scaffolding implica um suporte temporário que “se dissipa” gradualmente à medida que a competência do aprendiz aumenta, permitindo-lhe operar em um nível de complexidade que excederia suas capacidades sem assistência (Brown et al. 1989, p. 11). Esses componentes da aprendizagem cognitiva operacionalizam de forma clara o apoio e a orientação que definem a assistência na ZDP vygotskyana.

De modo análogo, Pea (1993) apresenta uma visão da cognição que desafia o foco exclusivo na mente individual, propondo a inteligência distribuída como um arcabouço fundamental para entender a cognição e o aprendizado. Essa perspectiva, que vê a cognição como um fenômeno que "se estende para além da cabeça do pensador individual para incluir o ambiente físico e social" (Pea 1993, p. 47), estabelece um terreno fértil para um diálogo construtivo com a ZDP de Vygotsky, expandindo-a para além de suas formulações originais.

Uma das ideias centrais de Pea é que a inteligência não reside apenas nas cabeças das pessoas, mas também está distribuída entre pessoas e entre pessoas e ferramentas do ambiente (Pea 1993, p. 47). Ele argumenta que as práticas de inteligência distribuída são as que combinam o cognitivo e o material no desempenho de tarefas (Pea 1993, p. 48). Esta concepção da cognição como um fenômeno fundamentalmente estendido e distribuído se alinha e, ao mesmo tempo, amplia a ZDP de Vygotsky. Quem postulava que o desenvolvimento das funções psicológicas superiores ocorre através da mediação, que ele descrevia como a ação dos instrumentos e signos A ZDP é precisamente o espaço onde o indivíduo, com a ajuda de um "outro mais capaz", se apropria desses instrumentos e signos e de novas formas de pensar. Pea, no entanto, move o foco da internalização para uma interdependência contínua e dinâmica. A inteligência distribuída sugere que o outro mais capaz na ZDP não é apenas uma pessoa, mas pode ser um sistema sociotécnico mais amplo, incluindo recursos informacionais (Pea, 1993, p. 48) e a organização social da atividade. O que o aprendiz pode fazer com a ajuda de outros é enriquecido pela consideração de que esses outros podem ser recursos materiais e simbólicos inerentes à prática distribuída, que colaboram na amplificação das capacidades cognitivas.

Outra ideia crucial de Pea é a ênfase nas práticas como o locus da inteligência distribuída, afirmando que as práticas de inteligência distribuída são o locus da cognição (Pea 1993, p. 57). Isso implica que a cognição não é apenas algo que acontece na mente, mas algo que é feito através da interação situada em atividades específicas. Esta ênfase na prática tem uma ressonância com a compreensão da ZDP de Vygotsky, que não é um mero espaço de desenvolvimento individual isolado, mas uma zona de atividade conjunta e colaborativa. Para Vygotsky o desenvolvimento ocorre primeiro no nível social, e apenas depois no nível individual, através da participação em práticas sociais mediadas. Pea expande essa ideia ao mostrar como as ferramentas cognitivas descritas como calculadoras, lápis e papel, programas de computador, e até mesmo estruturas linguísticas que dão forma ao pensamento e ao discurso e as práticas organizacionais são partes intrínsecas da inteligência em ação, não apenas auxiliares (Pea 1993, p. 54).

A ZDP, vista através da lente da inteligência distribuída, não é apenas um espaço de andamiaje interpessoal, mas um ecossistema de recursos (humanos, materiais, simbólicos) que amplificam a capacidade do aprendiz de participar em práticas cognitivamente exigentes por meio do uso estratégico e da configuração de artefatos e da participação nas estruturas sociais. A co-construção de conhecimento dentro da ZDP, para Pea, envolveria não apenas a interação dialógica, mas também o aproveitamento e a organização de artefatos e a participação ativa em sistemas sociais que distribuem a carga cognitiva.

Por fim, Herrero e Brown (2010) fundamentam sua proposta de cognição distribuída na crítica ao modelo tradicional de inteligência individual, argumentando que a inteligência não é uma propriedade atribuída da mente dos indivíduos, mas está distribuída entre as pessoas, e entre as pessoas e as ferramentas físicas e os sistemas simbólicos (p. 253). Esta perspectiva encontra notáveis convergências com a teoria vygotskiana das ZDP, particularmente na compreensão do aprendizado como processo fundamentalmente social e mediado. Os autores baseiam-se em Pea (1993) para definir a inteligência como algo "alcançado mais do que possuído", caracterizando-a como um conceito dinâmico de inteligência: um processo no qual as pessoas se envolvem ativamente (Herrero & Brown 2010, p. 256). Esta formulação dialoga diretamente com a concepção vygotskiana de desenvolvimento como processo dinâmico que emerge na interação social, embora a cognição distribuída amplie o escopo da mediação social ao reconhecer múltiplas direções de influência entre os participantes.

O conceito de internalização, central na obra vygotskiana, encontra eco na descrição que os autores fazem de Wertsch (1991), segundo o qual as funções mentais de uma pessoa não são uma mera cópia dos processos sociais organizados em seu ambiente, mas também são o resultado da transformação individual desses processos (Herrero & Brown 2010, p. 257). Esta formulação mantém a essência da ZDP a transformação do interpsicológico em intrapsicológico , mas a situa dentro de um marco mais amplo onde o conhecimento se move de um nível social para um individual através da transformação constante e interação que leva ao desenvolvimento pessoal" (Herrero & Brown 2010, p. 257). A diferença fundamental reside na direcionalidade do processo: enquanto a ZDP tradicionalmente implica uma progressão do menos capaz ao mais capaz, a cognição distribuída propõe que "todos aprendem uns com os outros" (Herrero & Brown, 2010, p. 257).

Os Grupos Interativos descritos por Herrero y Brown (2010) funcionam como uma materialização sofisticada da ZDP, onde a zona de desenvolvimento não se estabelece apenas entre dois indivíduos, mas se distribui através de toda a comunidade educativa. Os autores explicam que estes grupos "são deliberadamente diversos" e envolvem "uma gama de diferentes voluntários, desde avós analfabetas até estudantes universitários da cidade" (Herrero & Brown 2010, p. 260). O caso de Pablo, estudante com necessidades educacionais especiais, ilustra a operação bidirecional da ZDP: Seus colegas de classe tiveram que se colocar no lugar dele e encontrar diferentes formas de entender os exercícios que estavam fazendo e construíram pontes entre os dois tipos de inteligência através da interação e diálogo (Herrero & Brown 2010, p. 261). Esta situação revela uma extensão da ZDP onde o outro mais capaz não é necessariamente quem possui maior conhecimento acadêmico, mas quem pode contribuir com perspectivas diferentes para a resolução de problemas, confirmando que tanto Pablo quanto seus colegas se beneficiaram desta interação (Herrero & Brown 2010, p. 261).

A crítica aos testes de QI apresentada pelos autores ressoa com a oposição vygotskiana às medições estáticas da inteligência. Herrero y Brown (2010) argumentam que as pontuações das crianças nos testes de QI não determinam seu potencial para ter sucesso acadêmico (Herrero & Brown 2010, p. 255) e identificam fatores como aprendizagem prévia e oportunidades de escolarização, e seu contexto social e cultural como influenciadores dos resultados (Herrero & Brown 2010, p. 254). Esta perspectiva ecoa a insistência de Vygotsky em que o desenvolvimento deve ser avaliado dinamicamente, considerando não apenas o que a criança pode fazer sozinha, mas seu potencial em colaboração. Os autores ampliam esta visão ao afirmar que quando as crianças recebem pontuações baixas em tais testes, elas internalizam a ideia de que não são muito inteligentes; esta crença então as leva a ter expectativas mais baixas de si mesmas (Herrero & Brown 2010, p. 255), demonstrando como as avaliações estáticas podem limitar o desenvolvimento das zonas proximais.

O diálogo entre a ZDP vygotskyana e as teorias da cognição situada e distribuída revela pontos de convergência explícitos que fortalecem uma visão unificada da aprendizagem. Primeiramente, todas as perspectivas rechaçam o modelo do aprendiz isolado, concebendo a cognição como um fenômeno fundamentalmente social, seja no plano interpsicológico de Vygotsky, no processo de "enculturação" de Brown, ou no sistema estendido de Pea. Em segundo lugar, o papel da mediação é central em todas elas: o que Vygotsky iniciou com signos e instrumentos é expandido para incluir ferramentas culturais, tecnológicas e práticas como elementos constitutivos da inteligência. Por fim, o conceito de "outro mais capaz" evolui: de um guia humano, passa a ser um sistema de apoio estruturado (andaime) na aprendizagem cognitiva e, finalmente, um ecossistema de recursos distribuídos. Assim, as três correntes convergem ao posicionar a aprendizagem não como um reflexo do desenvolvimento, mas como seu motor, um processo dinâmico e mediado que transforma o potencial em capacidade real através da participação em um mundo socialmente e materialmente estruturado.

Em síntese, este capítulo aborda a complexa relação entre aprendizado e desenvolvimento, uma questão central na psicologia educacional. Crítico às abordagens que os separam ou os subordinam, Vygotsky posiciona a aprendizagem como um processo ativo que impulsiona o desenvolvimento. Ao apresentar a ZDP, o autor enfatiza a importância da interação social mediada por outros mais capazes para o surgimento das funções psicológicas superiores, afirmando que o desenvolvimento se dá primeiramente no plano social para depois ser internalizado. Esta perspectiva, presente na resenha, destaca que o aprendizado é um motor, e não um mero produto, do desenvolvimento. Em termos educacionais, a abordagem de Vygotsky sugere que as práticas pedagógicas mais eficazes são aquelas que promovem a interação e a colaboração, criando ambientes onde o aprendizado acontece no contexto da ZDP. Isso permite que os estudantes alcancem níveis de funcionamento que superam suas capacidades atuais, preparando-os para os desafios futuros e para uma participação mais plena e ativa em suas comunidades.

Contudo, a relevância dessas ideias transcende o debate teórico e ganha uma urgência particular nos contextos educativos latino-americanos. Em uma região marcada por profundas desigualdades sociais, a ZDP emerge como uma ferramenta contra o determinismo, lembrando que o potencial do estudante não é um teto fixado por sua origem, mas um horizonte expansível através de uma mediação pedagógica intencional e solidária. Aplicar esta perspectiva na América Latina significa ir além dos modelos que apenas reproduzem as desigualdades, valorizando a nossa imensa diversidade ao reconhecer que o "outro mais capaz" reside também nos múltiplos saberes presentes em nossas comunidades indígenas, afrodescendentes, rurais e urbanas. Isso nos compele, consequentemente, a repensar a avaliação, questionando a validade de sistemas estáticos e excludentes em favor de um olhar prospectivo, focado no potencial e no processo. Finalmente, em diálogo fecundo com as tradições de educação popular, como a de Paulo Freire, a abordagem vygotskyana fundamenta práticas pedagógicas baseadas na colaboração e no diálogo, essenciais para a formação de cidadãos críticos e participativos. Portanto, revisitar Vygotsky a partir da nossa realidade não é apenas um exercício acadêmico, mas um ato político: é reafirmar o compromisso com uma educação que promova a interação, a inclusão e a transformação social, preparando nossos estudantes para uma participação plena em suas diversas e complexas comunidades.


DECLARACIÓN DE IA Y TECNOLOGÍAS ASISTIDAS POR IA EN EL PROCESO DE ESCRITURA

Durante la preparación de este trabajo, la autora utilizó el modelo de lenguaje Gemini de Google (versión de octubre de 2025) con los siguientes fines: 1) traducir el resumen al inglés; 2) mejorar la claridad, cohesión y corrección gramatical del borrador inicial en portugués; 3) asistir la reestructuración de apartados específicos respuesta a los comentarios de los evaluadores. Tras el uso de esta herramienta, la autora revisó y editó críticamente todo el contenido para asegurar su alineación con el análisis y los objetivos de la investigación, y asume plena responsabilidad intelectual por el contenido de la publicación.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Brown, J. S., Collins, A., & Duguid, P. (1989). Situated cognition and the culture of learning (Technical Report No. 481). University of Illinois at Urbana-Champaign, Center for the Study of Reading.

Herrero, C., & Brown, M. (2010). Distributed cognition in community-based education. Revista de Psicodidáctica, 15(2), 253–268. http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=17517246008

Pea, R. D. (1993). Practices of distributed intelligence and designs for education. In G. Salomon (Ed.), Distributed cognitions: Psychological and educational considerations (pp. 47–81). Cambridge University Press.

Vygotsky, L. S. (1991). A formação social da mente: O desenvolvimento dos processos psicológicos superiores (J. C. Neto, L. S. M. Barreto & S. C. Afeche, Trads.; 4ª ed.). Martins Fontes. (Obra original publicada em 1978).

Wertsch, J. V. (1991). Voices of the mind: A sociocultural approach to mediated action. Harvard University Press.


Datos de correspondencia

Castillo Cabezas, María C.
Doutoranda em Educação em Ciências
Universidade Federal do Rio Grande - FURG
Brasil
Profesora auxiliar Universidad del Valle
Colombia

 
ORCID:  https://orcid.org/0000-0003-4086-9686
correo electrónico: maria.castillo.cabezas@correounivalle.edu.co

 
Esta obra está bajo una licencia de Creative Commons
Reconocimiento-NoComercial-CompartirIgual 4.0 Internacional.